3 de agosto de 2011

Umbu

O menino caminhava pela estrada que parecia sem fim, sem curva. Tarde árida de poeira e sol que ardia em sua pele fina. Um pássaro grande e negro cruzou-lhe a cabeça. Modo de dizer, porque na verdade cruzou o céu, lá no alto, como se fosse tocar nas portas do paraíso.
O menino cambaleante de cansaço e fome deixava os dedos tropeçarem nas pequenas pedras que se estendiam por todo o caminho. Desejou a noite em que estaria em casa, junto à mãe, e poderia se esticar no chão frio da sala para ver o filme de guerreiros que passaria mais tarde. Alguns goles de café, um pão com margarina. Olharia pela frexa da porta para conferir se sua irmã menor estaria dormindo. Iria até o quintal para ver o azulão na gaiola, o pé de goiaba e, sobre aquele muro baixo de tijolos descascados, esticaria os olhos por aquela escuridão sem fim. Lá no meio do nada, poderia haver alguma espécie de bicho, bicho malvado que mata galinha, vaca e até gente.
A pedra que lhe sangrou o dedo o trouxe de volta à estrada quente. Faltava muito ainda. Resolveu parar um pouco e se escorar num pé de umbu. Um umbuzeiro grande, com umbus doces e suculentos. Sua boca salivou e então sem vacilar, subiu, feito um macaquinho, nos mais altos galhos para pegar o umbu mais doce. Mordeu com vontade. A árvore contorcida se confundia com o corpo do menino. Um esconderijo perfeito contra qualquer papa angu. Enquanto o caldo do umbu escorria-lhe pela boca e pescoço, parecendo uma serpente prestes a atingir sua barriga, o menino fechava os olhos para usufruir melhor aquela sensação de prazer. Doce um umbu. Doce vida. Entre as folhas do umbuzeiro, protegia-se do sol. Estava no alto, agora dominante. Coroado Rei do sertão, presenteado com o umbu mais doce e desejado da região. Um vento forte soprou. Apertou com mais força o galho. Quando abriu os olhos viu nuvens brancas que agora cobriam todo o céu. Eram muitas. Fato estranho, pois era uma tarde sem nuvens. Dizem que quando uma criança vira anjo, espalham-se pelo céu centenas de nuvens em forma de bolotas de algodão. Galhos quebrados.

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